Família...Bens...Atrocidades...Luto!
Um homem às adversidades...
Indiferente à civilização, posta-se aos olhos do descaso, (contraposta ao mundo globalizado) um velho casarão estilo colonial, que numa inoperante magnificência à sua época, resiste ao modernismo exacerbado do capitalismo consumista e transformador vigente. São lojas de CDs, de Dvds, de computadores, de jogos eletrônicos, e nas casas em volta antenas de TV a cabo, e outras parafernálias afins, destoando num testemunho a uma deslumbrante arquitetura do final do século XIX. Revelando assim o antagonismo de épocas, diante de suas originalidades e peculiaridades.
Nas suas paredes em degeneração, múltiplas camadas de tinta, revelavam décadas de historias, as quais foram nos seus respectivos tempos vividas por múltiplas gerações que nela à regência do tempo a habitaram. Enormes janelas e portas com desenhos de arcanjos rudemente esculpidos adornavam a antiga fachada, lamparinas ao consumo da ferrugem circundavam a casa sugerindo luminosidade à antiga decoração dando assim uma compreensão de aconchego e opulência, levando a férteis imaginações sobre aquela magnífica edificação que outrora pousava imponente aos olhos daqueles que às suas muralhas não podiam transpor.
Ao limiar do crepúsculo, na calçada ladrilhada por antigos tijolos tortuosos já escurecidos pelo tempo, à sombra arejada de uma velha e frondosa arvore de juazeiro que sombreava toda lateral da casa, um grupo de jovens composto por duas mulheres - Carla e Naiara - e um homem – Leandro -, ali sentados, indagavam sobre as nebulosas historias que compreendia aquela casa, já há tempos privada da presença de moradores.
Quando seus pensamentos eram freqüentados por investigações concernentes àquela casa, histórias mirabolantes incitavam as fecundas mentes em compleição.
Carla alheia ao resto do ambiente, com olhar fixo a uma das portas onde o rosto (desfigurado pelo tempo) de um arcanjo, em voz tênue, como se alguém tivesse a espreita-los proferiu:
_ Tenho a ligeira impressão de que estamos sendo observados, seria algum fantasma?
_Leandro: Deve ser o fantasma do perverso Coronel Liborio Albuquerque, que morou aqui a muitos e muitos anos atrás.
Carla e Naiara (num sobressalto) _ Quem foi esse Coronel Liborio?
Leandro num tom sarcástico riu e disse:
_ Vocês querem mesmo saber!
As garotas envolvidas pela curiosidade que ao mesmo tempo as assustava, sem titubear confirmaram o interesse de ambas em conhecer a historia do perverso Coronel Liborio Albuquerque.
Leandro já em tom mais sério e tenebroso deu inicio a mais apavorante historia a que tiveram ingresso:
_ Meu avô contou-me por mais de uma vez, que o pai dele meu bisavô teria contado-lhe, que aqui mesmo onde estamos neste momento, hegemonizava uma bela e produtiva fazenda aonde residia o respeitado e temido Coronel Liborio Albuquerque e sua família. O Coronel era um homem inconfundível diante da sua aparência imperativamente singular, homem de meia idade, alto, de pele clara e bem tratada; à sua face pousava expressivas costeletas atreladas a uma feição inesgotávelmente rude e mal humorada quando olhos fumegados por uma intensa e enigmática obscuridade em cumplicidade o traduziam, contudo utilizava-se de um vocabulário um tanto quanto apurado, dia a dia apresentava-se em trajes bem alinhados, alardeando aos desavisados o peso do seu poder já que nenhum mortal a sua ciência tinha qualquer condição de adotar proeminente esmero (já que os Albuquerque eram os únicos num raio de milhares de quilômetros a ter acesso a civilização), à sua mão direita figurava tecido a sua anatomia um alinhado chicote, e na cinta ostentava um persuasivo e inseparável trabuco, um artesanalmente trabalhado punhal e um lindíssimo relógio trabalhado em ouro, no entanto essa figura folcloricamente assim apresentada era notoriamente conhecida pelas muitas atrocidades que conclusivamente lhe faziam jus. O Coronel Liborio era casado com dona Florinda Albuquerque, mulher doce de riso triste, e desse casamento nasceu uma linda menina, que por seu pai lhe foi dado o nome de Ana Rosa. Ana Rosa foi sua única filha, dentro de casa era ela rodeada por vários empregados, que tinham como prioridade assistir a todas os seus desejos, sua mãe discordava de tal tratamento, pois dizia ela que a filha não seria uma mulher de personalidade constituída, lamentando a sua falta de espontaneidade nos seus desejos e posicionamentos, pois o Coronel seu pai mesmo tratando-a desta forma chegava às vezes ainda determinar o que ela vestia, o que ela comia, os seus horários e os lugares onde deveria andar. Aos olhos do pai limitava-se ao interior da casa tendo ao seu dispor tudo que necessitava, quando decidia passear pela fazenda tinha sempre em sua companhia três ou quatro capangas do Coronel seu pai a protege-la, o único motivo que lhe dava a autoridade de romper as fronteiras das terras do Coronel Liborio, era a visita à igreja. Era ela uma menina tristonha, mas graças ao súbito encontro com a palavra de Deus, um brilho gritante nos teus olhos contemplava à cumplicidade de um esplendoroso sorriso, àquela face delicadamente rósea, e isso acontecia todas as vezes que Ana Rosa visitava a casa de Deus.
As terras do Coronel eram elas demarcadas pela imensidão, onde vista de nenhum ser podia alcançar a sua terminação, sendo parte delas conquistadas através do latifúndio, pratica habitual do velho coronel. Nesta imensidão de terras, se era trabalhada mais de uma cultura agrícola, como o café, a cana-de-açúcar e o algodão, e um criatório numeroso de gado e de caprino que nem mesmo o Coronel tinha noção da quantidade, assim fazendo do Coronel o homem mais rico da região. E para que se fosse mantida suas riquezas, uma quantidade numerosa de funcionários trabalhava em regime de escravidão, tendo como recompensa estes pela sua lida diária morar em condição de descaso numa parte esquecida da colossal fazenda.
Às proximidades da deslumbrante fazenda ao sopé desta mesma chapada que hoje esboça o nosso formoso postal, figurava-se a vila Quixadá (atualmente chamada de Luminosa, nossa cidade), às suas extremidades densas e extensivas matas subiam e desciam até o deitar do céu, de significância provinciana, Quixadá apontava-se nula à civilização.. Envolta por estas mesmas expressivas montanhas e belíssimas cachoeiras, que na sua transversalidade ao chamado do já não mais imponente rio Cacicó, dava-se origem a retilíneos riachos que cortavam a já então inexistente mata, rio este que até hoje banha esta região, abastecido por estas mesmas cachoeiras e riachos que até então deleitamos, claro que com algumas muitas irreversíveis diferenças, Quixadá tinha também à sua entrada principal um quilométrico corredor ornado por simetricamente enfileiradas enormes jabuticabeiras que aos seus galhos apresentavam-se salientes lamparinas pra que à noite os moradores ou mesmo visitantes adentrassem ao lugarejo sem problemas com possíveis ataques de animais ferozes ou até mesmo para que estes não viessem a se perder embrenhando-se na mata e assim o nível de periculosidade ficar maior ainda. Lugar pacato, de pessoas simples e harmoniosas, porém assaz sofredoras, era ela constituída na sua formação por quatro desarranjadas ruas, ladeadas por pequenos casebres cuja fachada tinha aparências desconfortáveis e inóspitas, retratando assim a pobreza dos camponeses que ali residiam, à entrada da vila uma taberna regia o entretenimento da localidade onde mulheres e homens divertiam-se após um dia árduo de trabalho, diante das existenciais adversidades, a relação entre os mesmos era de uma solidariedade e união que chegava a irritar e até mesmo provocar receio ao inumano Coronel Liborio, pois já diz o ditado que “a união faz a força”.
Nas suas quatro únicas ruas, diariamente pessoas e animais transitavam na mais natural familiaridade. Na sua rua principal onde funcionava o botequim, também ao seu final ostentava uma pequena igreja de alvenaria, tendo assim esta rua uma significância maior, pois era o referencial do local. O seu comercio era fundamentado na pequena agricultura e em pequenas criações de caprinos, bovinos e alguns porcos e galinhas, entretanto esta ainda com todas as suas dificuldades era então explorada pelo desalmado Coronel, que ao identificar algum belo animal ou obter conhecimento de uma suntuosa colheita por qualquer que fosse o produto, se apossava pagando muito menos da sua valia.
Raramente a moça freqüentava a vila, pois nela existiam garbosos jovens camponeses que diante da ameaça de tortura e morte executada pelo senhor seu pai (o Coronel), evitavam estes ao menos cumprimenta-la, mesmo assim com medo e respeito, era ela por alguns audaciosos rapazes cortejada por meio de furtivos olhares. Ana Rosa não saia sem a companhia dos capangas do coronel, homens de historias medonhas e de aparências nada agradáveis, sempre em bando, montando fortes e vistosos cavalos, faziam valer as ordens do Coronel mesmo que tivesse de matar. Estes sempre envoltos por enfadadas capas pretas, traziam à cabeça enormes chapéus de massa que escondiam a sua sombra, faces marcadas por inescrupulosas maleficências, aos pés velhas botas de canos longos com esporas bem trabalhados que ao tintinlar no ar anunciavam o pavor a quem as ouvisse, e com tal macabro estilo faziam e aconteciam por onde passavam tendo sempre o aval do Coronel. Na cinta ostentavam com naturalidade, enormes revólveres (já que o Coronel era Delegado, Juiz e Prefeito do local), revelando sem nenhum acanhamento as suas intenções para quem não respeitasse a filha do coronel como se deveria de ser, anulando assim o direito de viver em normalidade da pobre donzela, pois até as meninas que deleitavam da mesma jovialidade da jovem Ana rosa tinham receio de uma aproximação, temendo algum tipo de retaliação, por serem pobres e por terem a liberdade de um comportamento sem muitas delimitações ou critérios.
O tempo passou e a bela Ana Rosa crescia e ficava mais bela ainda. Todos baixavam os olhos à beleza de Ana Rosa, pois numa das suas raras visitas à vila, um atrevido mancebo foi tombado morto alvejado por vários tiros (de entusiasmados rifles e revolveres) deflagrados sem piedade pelos fieis capangas do coronel, precisamente por este ter direcionado uma atenção indevida e inconseqüente a bela menina, indo de encontro ao gosto e ordens do desapiedado Coronel.
E o tempo apressou-se, porém nada mais havia de diferente acontecido foi quando numa tradicional manhã de natal as descrentes pessoas da daquela pequena aldeia vivenciariam uma brusca mudança nas suas pacatas historias de vidas já tão muito sofridas. Como de costume as famílias da vila reuniam-se em frente à igreja num sortido desjejum natalino, foi quando se percebeu iniciando-se uma súbita penumbra ocasionada por um raro eclipse solar, que atingia até então as bordas do sol, e estes levados por uma mística dos seus antepassados que algo de ruim lhes poderia acontecer, em prece rogavam a Deus para que não viesse a se confirmar os seus temidos prognósticos. Com o avançar do tempo, o céu de Quixadá era tomado por inevitável escuridão, anunciando o algo que ninguém desejaria ao menos saber.
Na fazenda, a linda Ana Rosa justificando ela a necessidade de ouvir a palavra de Deus resolveu ir até a vila, quando o Coronel Liborio, seu pai, contestou a viagem da moça, pois tomado por presságios alegava um péssimo prenuncio para aquele dia, mas diante de uma terna e suplicosa insistência não querendo contrariar ao pedido da moça em falar com o pároco local (já que o velho coronel era demasiadamente religioso), mesmo com o coração apertado deixou-a ir, porém como de costume Ana Rosa teria mais uma vez a indigesta companhia dos seus homens, e sempre fortemente armados, pois o Coronel era um homem execrado por muitos insatisfeitos com a sua postura mediante suas ardilosas conquistas.
Chegando à igreja os homens fieis ao Coronel não entraram, em respeito à casa de Deus já que estavam armados e destas sob o comando do instinto não podiam jamais se separar. Já dentro da aconchegante igreja aos olhos de Deus, se fazendo acompanhada, do jovem Padre de nome Antonio, já que toda a vila encontrava-se religiosamente degustando da farta ceia de natal posta à parte externa defronte a igreja. O Padre Antonio era um garboso moço, alto, loiro, de olhos claros, pele alva, destoando dos demais jovens que ali residiam, pois estes tinham baixa estatura, a pele escurecida e áspera era bastante maltrada por sempre estar exposta ao tempo e a terra.
Recém chegado à vila, vindo de terras distantes, o jovem Padre mal chegara e já tinha muitas admiradoras, que mesmo sabendo da sua convenção a igreja, não perdiam a oportunidade de se lançarem de alguma forma, causando até mesmo inveja e ciúmes dos casados e também dos solteiros que incondicionalmente também nele viam o majestoso homem que estava à frente da igreja local.
Minutos depois da moça ter deixado a fazenda, diante da penumbra que tomava os céus, o Coronel Liborio preocupado e impaciente, logo acomodado a uma confortável charrete resolveu ir até a igreja decidindo ele também procurar conforto na palavra do senhor e ao mesmo tempo estar ao lado da sua mimosa filha, acompanhada de mais alguns homens de sua inteira confiança partiu a caminho da vila, no trajeto a visibilidade da caravana já era um tanto deficiente, em virtude de um manto de escuridão que vestia a luz do sol sem nenhum tipo de resistência por parte do mesmo. A uma certa distancia foi avistada a vila, devido o corredor ornado por já acesas lamparinas que o ladeavam guiando assim a caravana que se aproximava até o seu núcleo, pois a luz do sol já não se fazia mais presente.
À frente da igreja a tenebrosa imagem do Coronel já se fazia presente, sob a luz das lamparinas a população, de sobressalto crendo na predição que acompanhava aquele dia, voltou a rezar agora em apelo a proteção divina, já que o Coronel era naquela comunidade visto como demônio. Desmontada a caravana, indiferente à babel de cristãos em desespero, juntando-se ao outro grupo que se postava à frente da igreja, perguntou então o Coronel por Ana Rosa sua filha, tendo em resposta pelo grupo, que a mesma encontrava-se no interior da igreja. A comunidade em volta da mesa atônita imaginava o pior, de súbito calam-se e ficam a observar o comportamento do grupo de jagunços que tomava a frente da igreja, o Coronel a adentra e a algumas passadas aproximando-se do confessionário se depara com gemidos, grunhidos de origem feminil, de imediato sem pestanejar numa ação irrefletida, temendo pela integridade física da sua estimada filha que ali se encontrava, violentamente arrebenta a porta do confessionário e se atem a uma lastimável cena, era ela, sua menina, sua filha, sua doce filha, a bela Ana Rosa acoplada ao galante pároco num frenético ritual ao pecado, pasmados com aquela aterrorizante figura inerte a fita-los, o casal entrega-se a um desesperado choro de clemência, prontamente sabendo o que vinha a acontecer-lhes, pois o recém chegado pároco apesar do pouco tempo que estava na aldeia tinha este então conhecimento das atrocidades cometidas pelo Coronel com aqueles que não seguiam suas determinações, principalmente em se tratando da sua intocável, e preciosa filha. E foi num furor que o já desrespeitado Coronel em domínio do seu acalorado chicote começou a açoita-los e a gritar: “quenga... quenga... quenga...”. Atraído pelo pandemônio, o bando que estava a porta da pequena igreja entrou de arma em punho correndo dentre os bancos chegando até ao confessionário vindo do mesmo modo a testemunhar a safadeza da qual a até então casta Ana Rosa estava fazendo parte. Aos solavancos, arrastada pelo cabelo às mãos do ensandecido Coronel seu pai, ainda despida a moça foi levada à frente da igreja, já o padre também ainda despido foi conduzido aos safanões e pontapés pelos capangas ao mesmo destino da sua concubina, a comunidade estarrecida não entendia o que realmente estava acontecendo, foi quando ouviram o Coronel em cólera bradar para seus fieis subordinados “crucifique-os... crucifique-os... estes dois depravados... excomungados!”. Ouviam-se choro, gritos e pedidos de clemência vindo da multidão que assistia a tudo ignorantes ao motivo que levava àquele ato de barbaridade, obedientes às ordens do patrão, os homens do desapontado Coronel logo procuraram providenciar postes de madeira e prego para efetuar a pena conferida pelo mesmo, nesse momento à luz do sol resistia ao negrume, devorando-o aos poucos como se estivesse a saborear da sua legitimidade indigesta as crenças do homem. Já providenciado os postes juntamente com enormes pregos fornecidos pelos moradores mediante a uma livre e espontânea pressão (a mira de revolveres e rifles), foram conduzidos então os corpos nus de Ana Rosa e o do jovem padre Antônio. Diante de muitos gritos de piedade e clemência foram cravados os vigorosos pregos sem nenhum remorso, por alguns dos fieis homens do Coronel, outros de armas em punho impediam a intervenção de quem por insanidade viesse a atrever-se contra as ordens do naquele momento insano Coronel. Logo crucificados foram erguidos perante olhos aterrorizados e clamorosos, numa miscelânea de terror com dor o rosto da bela Ana Rosa tomou uma forma já mais vista pelos então reprimidos espectadores. Já não estava mais ali a linda e ingênua menina, que antes tinha o trato de princesa por aquele que agora era o seu algoz, e que naquele instante restringia a sua pretensão de viver. Diante de todos ali presentes foi dada a ordem de que os corpos de ambos ficariam ali expostos até que a morte em clemência destes decorresse a revelia do tempo, sem que ninguém pudesse aproximar-se com intuito de ajuda-los, para garantir suas ordens foram deixados alguns muitos homens fortemente armados para fazer cumprir o determinado.
Já com o sol liberto pela negritude, o Coronel se foi, deixando para trás o dia mais macabro do então pacato vilarejo, dia este a ser degustado amargamente pela platéia ali presente.
No terceiro dia após a sua partida, o jovem casal não mais suportando os ferimentos causados pela barbárie em compleição, expiraram para a atmosfera terrestre.
Abandonados pelos seus secundários executores, foram logo recolhidos e enterrados por aqueles que testemunharam aterrorizados o nefasto acontecimento, ficando na calçada da igreja as marcas de sangue assim simbolizando a triste trajetória da vida à morte... Amem! Que ali se incidiu.
Tempos depois do acontecido, sua mulher dona Florinda extremamente demudada pereceu, em situação de penúria, pois desde o dia em que Ana Rosa se foi pra nuca mais voltar, sua mãe vegetava numa velha cadeira de balanço, sem comer, nem beber, e sem proferir nenhuma palavra. E por algum tempo após a sua partida por ordem do desvalido Coronel, durante o dia à velha cadeira ficava sob a arvore do juazeiro e ao apropriar-se da noite, os empregados da fazenda a levava para dentro do então agora ainda maior casarão.
Dias depois no ápice da aurora de um domingo qualquer, enfadado pela consciência, não suportando a lacunosa ausência da família, o Coronel inteiramente desapropriado de razão, fitando o horizonte em um vago olhar em meio à obscuridade sacou então do seu inseparável revolver e atirou na própria cabeça esfacelando-a, extraindo-lhe assim a sua abstrusa vida de mal fazeres, e com o seu trágico fim os seus fieis seguidores, tomando de montaria partiram sem deixar vestígio do seu breve e conturbado destino, pois os mesmos ali eram devedores da justiça, que depois de tempos de anulação iria com certeza imperar naquele agora então tranqüilo e harmônico lugarejo.
Os animais, as plantações e as valiosidades pessoais do falecido Coronel Liborio Albuquerque, como pagamento de muitos anos de trabalho prestado sob sujeição, foram apoderadas pelas famílias que a ele servia, e suas terras uma parte foram apossadas por aqueles a quem era de direito e outra parte foi dividida entre os antes empregados e os há tempos lesados moradores da vila Quixadá, já que o finado coronel só tinha como sua única herdeira a angelical saudosa Ana Rosa. No casarão passou a morar um ancião que tinha o respeito e admiração de todos que ali trabalhavam e que na vila morava. Na vila uma festa foi dada para comemorar o desfecho de um tempo de terror e de dor que assolava a todos que habitavam à vista do Coronel.
Foi então que o sol voltou a brilhar para todos sem que o antes temido Coronel Liborio vivesse para ofuscar os anseios destes, do mais simples ao mais majestoso.
Carla e Naiara estupefatas ouviam Leandro terminar a historia sem em nenhum momento atrever-se a interromper, pois estavam chocadas diante de tanta maldade. Já ao limiar do crepúsculo, Naiara perguntou:
_ Dona Florinda morreu sentada embaixo dessa arvore que aqui estamos?
Leandro num tom de acuidade confirmou, foi quando Carla já tremula de medo sugeriu que fossem embora, de imediato foi aceita a sugestão, e todos saíram as presas sem olhar para trás, a caminho da modernidade, para que já em casa voltassem a desfrutar da modernidade tecnológica que então fazia parte dos seus mundos, deixando para trás aquela historia medonha que outrora fez parte daquele lugar antagônico as suas particularidades.
Os tempos eram outros, mas o casarão era o mesmo, um tanto deteriorado é claro, não obstante estava ele lá complementando mais um dos cenários de sua historia heterogenizada por vidas passadas.
Dedico àqueles que viveram, ou que ainda vivem à mercê do imponente e desumano chicote, impunemente conduzido por coronéis que lacunaram ou que ainda lacunam a história de nosso país, açoitando sonhos de vidas por viver, desfazendo-as ao vento indiferente a tudo e a todos.
Eu, Emanoel Ferreira da Silva
Manollo Ferreira
Um comentário:
Esse é o meu garoto!!! Parabéns por mais esta façanha!
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