Um Enterro, E Um
Defunto Que Nada Tem Para Se Lembrar...!
!... Um defunto
bem arrumado, um caixão bem modelado, flores belas e perfumadas, velas em
castiçais a flamejar... Chororô, um aperto de mão, um abraço de consolação...
Consternação...!
... De boca em
boca, surgem versões de como o defunto morreu... Foi assim... Foi assado... Foi
de morte morrida... Foi de morte matada...
_ Era gente boa !
_ Era boa gente,
mas...
... No agora
descomedido vão da sala de estar, repousa o defunto, alheio a tudo e a todos:
Aos pesares, aos choros, as preces, ao valor e modelo das vestes e do caixão,
ao perfume e a beleza das flores em sua coloração, à luz e ao calor das velas
em meio ao corpo falecido na escuridão... Forma-se um aglomerado, gente que
entra, gente que sai, gente que junta, muita gente, sussurrando, chorando,
rezando, ‘curiando’...
... O velório
estende-se pela noite... Café, chá... Cachaça...!
Uma fogueira surge
em apelação a uma reunião para quem da noite vai velar... Um gole de cachaça
aqui, outro acolá, alguém conta uma piada... Risos... Mais alguns goles aqui,
outros goles acolá, mais algumas piadas a se contar... Gargalhadas !... E um
defunto sozinho, no descomedido vão da sala de estar, sem ninguém a
contemplar...
... Dorme a noite,
esvai-se o entusiasmo, esvazia-se a fogueira em fumaça e cinzas, surge o dia, e
novos personagens chegam para a próxima cena encenar.
... Castiçais
vazios, flores murchas, um defunto, um caixão, mais abraços de consolação... Consternação...
!
De boca em boca,
surgem versões de como o defunto morreu... Foi assim... Foi assado... Foi de
morte morrida... Foi de morte matada...
_ Era gente boa !
_ Era boa gente,
mas...
... Sai o enterro,
segue o cortejo, de mão em mão é levado o caixão, rezas e choros sonorizam a
tristeza, atraindo pessoas conhecidas do defunto, ou não. Seguindo em
procissão, norteia-se o destino do desafortunado ao arrastar dos pés a poeira o
chão.
À distância, um
pequeno cemitério é de se ver: Cruzes e catacumbas a se elevarem em prece. Ao
chegar, pronta já é de estar, uma cova cavada, sem o uso das mãos, sete palmos
medidos sem medição...
De boca em boca,
por mais uma vez, surgem versões de como morreu o defunto... Foi assim... Foi
assado... Foi de morte morrida... Foi de morte matada...
_ Era gente boa !
_ Era boa gente,
mas...
Um alvoroço se faz
na última hora de o defunto enterrar... Era gente discutindo, era gente
rezando, era gente chorando, era gente gritando, que o defunto errado estava,
com a cabeça pra frente, com os pés pra trás, que dos pés se fazia a entrada,
que dos pés também se fazia a saída... Era gente discutindo, era gente
gritando, era gente rezando, era gente chorando, era gente enterrada, era gente
enterrando, era gente morrendo, era gente vivendo... Foi-se um Enterro, E Um Defunto Que Nada Tem Para Se Lembrar.
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